Oficialmente, Portugal tem 10,7 milhões de habitantes (segundo dados de 2024). Esta é a sexta subida consecutiva e muito se deve a emigração, que tem ajudado na taxa de natalidade. Tal como acontece em vários países «desenvolvidos», nascemos (mas também morremos) pouco. A população em Portugal com 80 anos ou mais duplicou nos últimos 20 anos, representando aproximadamente 7% da população total. A nossa população, tal como o próprio país, já vai na quarta idade.
Nas escolas aprendemos sempre que Portugal tem cerca de 11 milhões de habitantes e comunidades de luso-descendentes em países como França, Luxemburgo ou na Venezuela (uma região para onde temos que olhar para ver o que Trump vai fazer). Existem figuras internacionais, como é o caso do cantor canadiano Shawn Mendes ou da lider venezuelana María Corina Machado que têm sangue português. E como estes dois casos há milhares, entre personagens públicas e anónimos. Pessoas que alguma vez saíram do país mas levaram sempre «Portugal no Coração» (que também é nome de um antigo programa da RTP que tinha como apresentadores uma pessoa do sul do país, outra do norte, uma luso-espanhola e uma dos PALOP).
Mas o que significa ser português? Existem características especiais ou não passamos numa junção de povos que se encontraram na «ocidental praia lusitana». Já no final dos «Lusíadas», penso que seja no capítulo da Ilha dos Amores, Camões escreveu que os descendentes dos Descobridores são os que partilham entre si não só a garra mas também um amor semelhante que pode unir vários povos.
O atual Governo vai mudar a Lei da Nacionalidade e várias vozes têm-se levantado contra os portugueses (pelo menos no papel) que não falam português. Pessoas que adquirem a nacionalidade portuguesa para terem passaporte comunitário mas pouco ou nada conhecem do país (para alguns guias turísticos, a estátua do D. José apenas representa um senhor a cavalo). É possível abrir as nossas portas ao mundo (e em massa) sem perder a essência de Portugal e do ser português? Muitos já fizeram esta pergunta que claramente é impossível de responder. Apenas podemos dar a nossa opinião, como faço neste artigo de opinião.
Nesta parte tenho que concordar com as vozes que alertam para este problema. É possível ser português (ou de outro país qualquer. Basta sentir no coração) sem ter nascido no local ou ter pais (avós ou outros ascendentes) lusos? A Comunidade Israelita de Lisboa quer a lei dos Sefarditas (estes são os que saíram do território ibérico há vários séculos) por mais três anos mas existem vozes contra, como é o caso do jornalista Miguel Sousa Tavares, que diz não aceitar «que Portugal esteja a dar nacionalidade a cidadãos de Israel num momento em que Israel recusa quaisquer direitos à população palestiniana». Esta questão marcou mais a festa do Avante (a típica comemoração pois férias de verão feita pelo Partido Comunista Português) do que o que assistimos nos últimos dias. O verão foi tudo menos «silly» (no jornalismo falamos mesmo na «silly season») e Luís Montenegro, na conferência de imprensa depois da queda do Elevador da Glória, referiu mesmo que os portugueses são «valentes». Que novidade, senhor primeiro-ministro! Já o hino o diz, não sei se recorda a parte do «Nação Valente e Imortal». E está parte do nosso hino não pode ser apenas cantada antes de uma partida desportiva.
Não podemos, nem devemos, recorrer ao populismo fácil. O que é ainda mais perigoso num período de eleições. As próximas serão as autárquicas mas já vemos as presidenciais ao fundo. Será que teremos «terra a vista» com a vitória de um antigo marinheiro ou vamos ter alguma surpresa? Estas não costumam ser muito boa mas ainda vamos ter aguardar até Janeiro para descobrir quem será o próximo ocupante do Palácio de Belém. Seja quem seja o vencedor, a verdade é que nenhum será igual a Marcelo Rebelo de Sousa. O antigo professor universitário, especialmente no 10 de Junho, aproximou o Portugal (espaço físico) dos inúmeros portugais que existem espalhados pelo mundo. Basta haver um português que estamos lá. Hoje, a hora do almoço é a falar com o meu irmão arqueólogo, ele lembrou-me que Portugal teve uma forte e duradoura influência em Nagasaki, Japão, a partir de 1543, quando os exploradores portugueses chegaram pela primeira vez. Portugal usou Nagasaki como seu «enclave» mais oriental». Mais uma prova que os «portugueses » e as suas lembranças estão um pouco por todo o mundo.
Mas olhando para a perspectiva geral, há coisas bem piores. Este mês de Setembro começou com o major desastre dos últimos vinte e cinco anos em Portugal. O Elevador da Glória, que acompanhou a vida dos lisboetas (e não só) em quase 140 anos de história, caiu provocando 16 mortos e 21 feridos. Uns eram pessoas que estavam a sair do trabalho e que apenas queriam ir para casa, já outros estavam de visita a cidade mais antiga da Europa.
Este desastre comoveu o país e o mundo (há mortos de França ao Canadá) pois demonstra a fragilidade não só da vida mas também das nossas memórias. E muitos dos que viram esta notícia tem uma memória, uma foto, com o «cavalinho da Glória» (como um menino descreveu o ascensor amarelo). Agora que tratamos dos mortos e dos feridos, como dizia o Marquês de Pombal, temos que perceber o porquê do que aconteceu para que não volte a passar. Mas necessitamos de fazer isto com urgência e não deixar tudo para um julgamento que será feito daqui a décadas (como o de José Sócrates). A lentidão é claramente um problema deste belo país que leva as Quinas ao peito.
Uma das ideias poéticas da CPLP é que a nossa casa comum seja a língua portuguesa. Numa cerimónia de homenagem, que decorreu na Cidade de Futebol aos antigos futebolistas Jorge Costa e Diogo Jota, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que existem 30 milhões de portugueses e luso-descendentes no mundo (estes dados não conseguem ser provados). É mais certo que existem 5,7 milhões de portugueses e luso-descendentes espalhados pelo mundo. Só que não vivem neste retângulo à beira-mar plantado. Mesmo que os números avançados pelo presidente da república não sendo certos, a verdade é que existem vários portugais espalhados pelo mundo. Uma vez, Lula da Silva disse que só no Brasil (que comemorou mais um ano de independência), se todos os descendentes de português pedissem a nacionalidade eram vinte milhões de novos portugueses. Precisamos de portugueses mas também de algo que nos una e não seja apenas um passaporte. O que pode ser? Isso deixo ao pensamento de cada um de vocês.
Andreia Rodrigues

