Maquiavélico

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Maquiavélico: palavra associada à manipulação, hipocrisia e a determinados meios para atingir fins.  

Os hiatos temporais, na vida, são necessários. Escrever deve ser um ato puro, verdadeiramente sentido e por isso, só o faço quando algo me impele a fazê-lo.

Desenganem-se os que pensam, com base no título, que se trata de um articulo moral ou inquisitório. Regresso, só e apenas, às minhas origens académicas. Às recordações da alma mater.

Florença, berço do renascimento, tem associados a si nomes como Dante Alighieri, Cosme de Médici ou Sandro Botticelli. No entanto, e pelo título do artigo, falaremos de outra personagem histórica: Nicolau Maquiavel.  Maquiavel nasceu na república florentina no ano de 1469 e cresceu durante o governo de Lourenço de Médici assistindo a forças políticas antagónicas que iriam marcar as suas reflexões filosóficas.[1]

Toda a vida e obra de maquiavel é de extrema importância, mas o apanágio deste artigo é sem dúvida “O Príncipe”; escrito no exílio, é uma das obras mais relevantes e influentes da filosofia política. Não pretendo resumir ou fazer uma exposição exaustiva da obra. Deixo as questões profundas para quem entende mais que eu, por gosto ou profissão. Pretendo apenas incitar-vos. Tal como me incitaram a mim.

Comecei por explicar que este artigo não tinha cariz moral; de encontro à obra de Maquiavel, “O Príncipe” separa completamente a política da moral. De um ponto de vista pragmático, esta obra explora experiências de governação e governantes de forma a distinguir o poder e os seus mecanismos. Mais do que estes pontos, o autor definiu o príncipe ideal; entenda-se governante. Contra a passividade mostra-nos a primazia da audácia. A virtude, virtú, não é a virtude tal como a conhecemos; é precisamente o oposto. É ação. Remete para qualidades que permitam adaptar-se a circunstâncias mutáveis. O governante não pode apenas confiar na fortuna (sorte ou destino).

“Precisando um príncipe de saber usar bem o animal, deve tomar como exemplo a raposa e o leão; pois o leão não é capaz de se defender das armadilhas, assim como a raposa não se sabe defender dos lobos. Deve, portanto, ser raposa para conhecer as armadilhas e leão para espantar os lobos”.[2]

Mais vos poderia escrever sobre Maquiavel e particularmente sobre “O Príncipe”. Mas não nos chegaria um artigo. Resumidamente, pode entender-se que Maquiavel apresenta a ideia de que um estado forte depende diretamente do perfil do seu soberano. Para o autor, e em último recurso, o príncipe ideal deveria ser amado e temido; no caso de não poder ser o primeiro, deveria ser temido.

“Contudo, o príncipe deve ser ponderado no seu pensamento e ação, não ter medo de si mesmo e proceder de forma equilibrada, com prudência e humanidade, para que a excessiva confiança não o torne incauto, nem a exagerada desconfiança o faça intolerável (…) é melhor ser amado que temido ou o inverso? A resposta é que seria de desejar ser ambas as coisas, mas como é difícil combiná-las, é muito mais seguro ser temido do que amado (…) Os homens têm menos receio de ofender a quem se faz amar do que a outro que se faça temer (…)”. [3]

Nesta obra, o autor apresenta apenas uma porção do seu pensamento político. Concretamente, uma solução política para o tempo em que foi escrita e face às necessidades e circunstâncias. De certa forma, e a meu ver, Maquiavel foi injustiçado pela História. Precede a conotação negativa do termo maquiavelismo.  Existem outras obras onde a sua perspetiva é moderada e diferente. “O Príncipe” foi escrito como solução aos problemas da Itália daquele tempo. Apenas isso; tão simples e tão complexo, ao mesmo tempo. Mesmo assim, poderemos considerar alguns dos seus pensamentos perigosos. Não pretendo julgar ou defender, apenas expor a obra que continua, até aos dias de hoje, a ser uma referência no que toca ao poder e à governação.

Nos tempos que correm, com a instabilidade presente, as circunstâncias conturbadas do mundo, às vezes das nossas vidas também, é cada vez mais imperativo que façamos algum tipo de reflexão. Que indaguemos um pouco mais. Que procuremos saber, perceber… Para entender o que nos rodeia.

Escrevi este pequeno artigo com alguma emoção; a filosofia política é extremamente importante na nossa formação. Como seres humanos. Não almejo que este artigo seja visto como tal. Apenas como um conjunto de palavras que gostaria que fossem levadas em conta; algo que vos incite a procurar respostas. Tal como eu procurei… E ainda procuro.

Nídia Ferreira da Cunha

 

[1] Filosofia: Maquiavel o grande mestre da política, National Geographic, Número 4, 2022

[2] Nicolau  Maquiavel, O Príncipe, Capítulo XVIII, página 84, Coleção Clássicos Política, Martins Fontes, 2001

[3] Nicolau  Maquiavel, O Príncipe, Capítulo XVII, página 80, Coleção Clássicos Política, Martins Fontes, 2001

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