Iberismo: déficit democrático

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Como é sabido a participação cidadã através do associativismo e dos movimentos civis é um valor democrático fundamental. A Constituição Espanhola (CE) consagra este princípio no artigo 23 e a Constituição Portuguesa (CP), no seu artigo 9, diz que “é uma tarefa fundamental do estado incentivar a participação democrática”. Intimamente ligada ao direito de participação e ao direito de petição, que está incluído no artigo 29 da CE e 52 do CP. A nível europeu, a participação cidadã está contemplada no artigo 44.º da Carta dos Direitos Fundamentais da UE

O desenvolvimento prático da Participação Cidadã e da Sociedade Civil em Espanha e Portugal tem um percurso importante desde o advento da democracia. Ambos os países passaram por uma explosão de iniciativas sociais e políticas durante os anos de 1970 e início dos anos 1980, alimentados pelo entusiasmo das novas democracias que apareceram após longas décadas de ditaduras. Associações de Vizinhos, de mulheres, de pais, novos partidos políticos de diferentes tendências surgiram com muita força, frescor e espontaneidade. Neste contexto, em 1976 nasceu a Liga Iberista em Portugal. Sabemos dessa Associação pois fez uma apresentação pública e escreveu um apelo à nação com uma marcante intenção sindical. Não temos registro de qual foi sua evolução, mas nenhuma actividade transcendeu. Durante as décadas de 1990 e 2000, os movimentos sociais diminuíram e a efervescência política diminuiu. Como consequência da crise de 2008, o descontentamento social e o nível de austeridade orçamental levaram ao ressurgimento da Participação Cidadã a todos os níveis. O movimento do 15-M de 2011 foi o ponto de partida para esta segunda onda de efervescência política e social. Uma das demandas mais visíveis foi por uma democracia mais participativa, que criou mecanismos como portais de transparência e orçamentos participativos. Neste cenário, surgiram entidades iberistas como o Partido Ibérico Iber e o Movimento Partido Ibérico, ligados à acção política institucional. Mais tarde foi criada a Plataforma Ibérica, implantada tanto em Espanha como em Portugal. Estas entidades, juntamente com outras de diferentes áreas, interessadas na cooperação luso-espanhola, organizaram-se recentemente no Fórum Cívico Ibérico, que realizou o seu primeiro acto público no decurso da Cimeira da Guarda, que ocorreu em Outubro de 2020 e onde houve a leitura de um manifesto de intenções.

A existência destas organizações iberistas supõem uma digna tentativa para tentar cobrir um autêntico déficit democrático na península Ibérica. É paradoxo que em sociedades democráticas avançadas como as de Espanha e de Portugal se mantenha o Iberismo num ponto incipiente e quase testemunhal. Porque o ideal ibérico, entendido em sentido estrito como tendência política para integrar Espanha e Portugal em toda uma península, atinge um mínimo de 20% das populações, segundo diversos estudos de opinião. Mas se entendermos o iberismo no sentido mais amplo, como uma tendência política, social e cultural, que visa uma aproximação estratégica entre os países ibéricos, atinge 70% da população. É de estranhar que uma tendência maioritária tenha um reflexo fraco nas entidades sociais.

A causa da baixa representatividade social do Iberismo reside na barreira que os Estados colocam à participação, que está a desmoronar gradualmente. Isto acontece em grande parte graças aos mecanismos da União Europeia.

Actualmente, existem dois aspectos cruciais na mesa das relações luso-espanholas: a elaboração de um novo tratado de amizade e cooperação e o desenvolvimento de uma estratégia comum de desenvolvimento transfronteiriço. Em ambas as matérias, deve ser ouvida a Sociedade Civil Ibérica, agrupada nas várias entidades participantes no Fórum Cívico Ibérico. Estamos abrindo um caminho sem precedentes e pela primeira vez as relações entre os nossos dois países têm um diálogo cívico, que complementa a acção dos Estados e dá conteúdo à democracia participativa alegada nas constituições.

O déficit democrático, que deixa sem voz um Iberismo de cooperação próprio do século XXI, amplamente apoiado pela sociedade peninsular, começa a ser vencido.

Desde aqui fazemos um apelo para que as administrações facilitem o nosso trabalho e nos vejam um aliado para uma finalidade que a todos nos une: fazer da península Ibérica um espaço europeu com melhores oportunidades de desenvolvimento pessoal para todos os seus habitantes, favorecendo a coesão social entre todos os cidadãos, independentemente da sua nacionalidade.

 

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