Portugal sempre foi um país tanto de chegada como de partida com comunidades que aportam um pouco da portugalidade aos 4 cantos do mundo. Os nossos peixinhos da horta (tempura no Japão) enchem os estômagos na Ásia e o cavaquinho (ukelele no Havai) dá músicas nas ilhas ocidentais. Quando partimos, e já dizia a cantora Linda de Suza, vamos com uma mala de cartão e cheios de sonhos.
A bola da vida rola e temos figuras que já demonstraram que quando queremos podemos ser os melhores do mundo. Uma visão de vida e de futuro que, infelizmente, não conseguimos concretizar neste nosso pequeno retângulo junto ao mar. Ninguém gosta de sair, mas a verdade é que é impossível viver do sol e da praia. Portugal é um país demograficamente, mas bastante valoroso. Fomos heróis do mar e agora somos da aviação, o meio que nos liga a pátria.
Marcelo Rebelo de Sousa uma vez disse que não existe apenas um Portugal e eu concordo. Viu-se isso durante a participação portuguesa no Mundial do Catar, quando no Rio de Janeiro, em Madrid ou na cidade da Praia víamos bandeira de Portugal e o verde e o vermelho pintado nos rostos. Somos maiores do que o que os nossos olhos cansados conseguem alcançar. Somos muito mais do que as praias algarvias ou as serras de Trás-os-Montes. Somos o sonho que comanda a vida (hoje deu-me para a poesia).
Estamos cansados pelas mais variantes razões e é por isso que saímos. Trabalhamos o dobro, mas ganhamos metade. Em alguns casos parece, como num sketch humorístico, que ainda estamos a pagar para trabalhar. Este sentimento, acompanhado também pelos nossos jovens (que segundo um relatório, foram, psicologicamente, bastante afetados pela pandemia), acontece, em parte, pela crise da inflação.
Saímos para ir ao supermercado e gastamos muito mais do que aquilo que fazíamos no início do ano. Sei que a desculpa usada é a guerra da Ucrânia, mas estamos a chegar ao fim de um ano que teve pouca coisa de bom. O que 2023 trará? Neste período da nossa história torna-se cada vez mais difícil responder à pergunta da praxe. Acho que todos nós gostaríamos que fosse o fim da guerra e a melhoria da economia. Com o PRR a dar finalmente frutos e os jovens do mundo a virem para Lisboa para comungar ao lado do Papa Francisco.
Antes fugíamos de regimes opressores e de uma pobreza extrema. Íamos a “salto” para França para trabalhar como empregadas da limpeza ou nas obras ou passávamos o Atlântico para paragens mais quentes, como é o caso do amigo Brasil ou a Venezuela (os Estados Unidos e o Canadá estão mais a norte do mapa). Muita coisa mudou nos últimos séculos e décadas, mas, e tal como o El País muito bem lembrou, na última década Portugal sofreu a sua segunda maior sangria demográfica desde 1864.
Em 2011 começou a crise económica que levou a entrada da Troika no país. Como todos nós sabemos, foi um período que não foi de “rosas” para ninguém, quer fosse a população ou os nossos políticos. Pedro Passos Coelho foi o homem que teve de trabalhar de perto com o temível trio de instituições que fez várias visitas e nenhuma delas foi para passar férias. Passos Coelho foi o homem que disse publicamente para os jovens emigrarem e muitos ouviram a ordem do primeiro-ministro.
Na altura, Angola é que estava a dar e a nossa “brilhante” juventude (a mais capacitada da nossa história) abandonou a sua “modesta casinha” e foi viver a vida de emigrante. Agora que estamos em período natalício, estes jovens emigrantes voltam a casa. As televisões enchem-se de imagens, gravadas no meio do aeroporto, de mães a correrem para os braços dos respetivos filhos.
Existe um programa de televisão bastante interessante, que passa tanto na RTP como na RTVE (só basta é a nacionalidade), que demonstra a vida de portugueses espalhados pelo mundo. O quadro que apresentam já não é o da Gaiola Dourada (um excelente filme feito por um filho de emigrantes). São pessoas bem jovens que um dia ponderam voltar ao país, mas é no Reino Unido ou na Alemanha (apenas dois exemplos) que conseguem superar-se nas suas áreas de educação.
São enfermeiros, bailarinos, banqueiros ou diretores de hotéis. São cérebros que “fugiram” e que podiam estar a suprir as várias lacunas que estamos atualmente a enfrentar, como é o caso da saúde. Enfrentamos uma sangria demográfica, mas ainda é possível reverter esta situação. Isto pode, e deve, ser feito com uma melhoria nas condições de vida dos que ainda cá estão, apoios para que estes emigrantes (jovens e menos jovens) voltem ao país para continuarem as suas várias atividades.
Portugal pode ser competitivo, atrativo. Os americanos olham para nós como a Califórnia da Europa (e isto não é só pelo bom tempo ou os vinhos) e os originários da CPLP são sempre bem-vindos. Apenas devemos dar condições para que eles cá estejam e não os deixar abandonados a sorte no Martim Moniz, como foi o caso dos timorenses que voaram para cá após um apelo do presidente de Portugal. As coisas podem mudar, mas não se pode apagar as marcas que a última década nos trouxe. Pede-se uma maior cooperação, tanto entre pessoas como países.