Soluna na Season Impulso 2023: os ritmos afro-latinos tomaram conta da pista nas Caldas da Rainha

A cantora nascida na Argentina fez parte do lote de artistas que encerrou a segunda e última parte da temporada deste ano do Festival Impulso

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Mais uma noite de muita (e boa) música no Centro Cultural e de Congressos das Caldas da Rainha (CCC). Mês após mês, o renovado Festival Impulso, que trocou o ar livre do Parque D. Carlos I pelo refúgio das quatro paredes, foi-nos habituando este ano a descobertas musicais cativantes e a momentos inolvidáveis. E a noite deste sábado (9) não foi exceção, com três propostas assinaláveis e dignas para um final de temporada que se pretendia festivo.

Com uma plateia composta, o serão não podia ter começado de forma mais requintada: com um bom vinho, maduro e de produção local. Bem comparado, estávamos mesmo a precisar de Cave Story, uma banda nascida há dez anos ali mesmo, nas Caldas da Rainha, para nos sentirmos embriagados pelo sabor a indie rock com umas notas de folk e de um punk mais lírico e experimental. A sala ia aquecendo e o público agitava-se freneticamente no compasso da bateria, indicando que estava realmente a gostar, mesmo que não fizesse ideia das letras das canções ou (provavelmente) alguns não soubessem a origem dos quatro músicos que se apresentavam diante de si. Isso foi das poucas coisas que a banda fez questão de esclarecer, numa das raras vezes em que o vocalista, Gonçalo Formiga, falou ao público. Além disso, agradeceu algumas vezes os aplausos e revelou que o mais recente disco, Wide Wall, Tree Tall, será editado em vinil por um produtor caldense. Foi a prova de que não são precisas muitas palavras para a música fazer sentido e agradar a quem a ouve.

Após o concerto e um curto intervalo, o pequeno auditório do CCC transformou-se numa verdadeira pista de dança. No palco, o DJ e produtor Dotorado Pro, nascido em Angola, marcava o passo para os sons que dominariam a noite, mais afro e eletrónicos. De repente, num gesto que parecia de falha técnica ou improviso, a voz de Soluna irrompe daquela mistura e a cantora afro-latina apresenta-se ao vivo com uma energia contagiante e um sorriso rasgado. A sua vivência multicultural, da América Latina à Península Ibérica, esteve bem presente ao longo de todo o concerto, em que cantou e se dirigiu ao público em três idiomas: castelhano, português e inglês. Do seu EP Gano, editado no ano passado, trouxe temas vibrantes e bem produzidos (com a ajuda de Dotorado Pro) como «Abajo», «Flaca» ou «Mala Fama», que o público cantou e celebrou como seus. Pausa para um momento íntimo e emotivo quando, à capela, decidiu interpretar “Coisas Bunitas”, tema da recém-falecida cantora Sara Tavares, com o qual conquistou um grande aplauso levado aos céus. Houve espaço também para apresentar alguns dos mais recentes singles, como «Hoy No Salgo» ou «Contigo», este último em colaboração com a portuguesa Iolanda, também ela ibérica na sua forma de cantar. E ainda deu a conhecer, em jeito de “snippet” [excerto] do próximo trabalho, o tema «Around Again», que parece ter passado no teste do público.

Em conversa com o EL TRAPEZIO, a artista elogiou a plateia caldense pela sua forma de “sentir a música” e de a entender, mesmo expressando-se, na maior parte das vezes, em espanhol. “Nasci na Argentina e cresci em Barcelona, por isso o meu primeiro idioma é o espanhol”, explicou, acrescentando que “o segundo idioma é o catalão e só depois vem o português e o inglês”. Pela infância passada em Espanha, leva também consigo várias influências musicais: “o pop espanhol” e o “jazz catalão”, que se juntam ao “semba, quizomba e música cabo-verdiana” apresentada pela mãe, angolana, e aos ritmos latino-hispânicos dos “boleros e chacareras” que o pai, argentino, lhe passou. Um legado que a faz ir “além” das nacionalidades que convivem no seu sangue e considerar a Península Ibérica a sua verdadeira “casa”, onde tudo isto pode coexistir.

Sobre o próximo trabalho – o primeiro de longa duração e também o primeiro conjunto de canções que a cantora vai produzir – Soluna revela que é um resultado “positivo” de um esforço de dois anos. “Tive tempo para desenvolver ideias e ir mais fundo nas emoções”, salientando que o álbum conjuga um lado mais íntimo com a efusividade habitual. “Não diria que tem mensagens mais tristes, mas são mais sobre a minha história, de onde eu venho e para onde quero ir”. Um lugar onde a artista possa “equilibrar o afro-beat e os sons urbanos latinos”, incluindo os sons da Lisboa que a tem acolhido nos últimos anos, fazendo também a fusão com a restante música ibérica. “Talvez seja esse o trabalho da minha vida”, conclui.

Depois da atuação de Soluna, a noite entregou-se derradeiramente à festa e à celebração com a dupla de DJs portugueses Moullinex e GPU Panic. No cartaz do festival e dos restantes espaços onde têm atuado, os seus nomes aparecem misteriosamente unidos por um △, o mesmo triângulo que dá forma à estrutura com que se apresentaram, frente a frente, ao vivo, com uma vista de 360º do público. Intervenientes habituais dos percursos artísticos um do outro, lançaram em março deste ano o álbum conjunto Break Me in Pieces, que destaca a voz etérea de GPU Panic e a paisagem sonora melancólica de Moullinex. Uma proposta que convenceu o público “sobrevivente” e trouxe a euforia como palavra de ordem para rematar esta temporada musical.

O Festival Impulso é promovido pela associação Pulsonar e pela Câmara Municipal de Caldas da Rainha, em parceria com a Escola Superior de Artes e Design do Politécnico de Leiria. Nesta quinta edição, o festival trocou o Parque D. Carlos I pelo Centro Cultural e de Congressos da cidade, programando artistas tão diversos como Angélica Salvi, Dino d’Santiago ou Bala Desejo. A organização garante novidades para 2024 “muito em breve”.

Fotos: Iara Duque.

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