A hora da Liberdade

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Agora que estamos a poucas horas (mais precisamente sete) do dia em que comemoramos os cinquenta anos da Revolução dos Cravos está na altura de olhar para trás e ver alguns dos acontecimentos que trouxeram a liberdade para que nesta Primavera as mulheres possam andar de mini-saia (algo que antes só podia ser usado pelas hospedeiras da TAP) ou os diversos países dos PALOP sejam independentes. A Revolução dos Cravos serviu de farol de luz para vários países que também viviam em regimes ditatoriais, como era o caso do regime militar no Brasil ou do Franquismo em Espanha.

Talvez estes países africanos tivessem sempre sido, mas se os Capitães de Abril não tivessem levantado as suas armas talvez tivessem sido perdidas muitas mais vidas. Agostinho Cabral, fundador do PAIGC, é um dos nomes marcantes de um período histórico que nos deu Salgueiro Maia, Otelo Saraiva de Carvalho, Marcello Caetano (o último ditador) ou Joaquim Furtado (o jornalista que leu o primeiro comunicado do MFA). São tantas as figuras marcantes!

Marcelo, o atual presidente e afilhado do antigo ditador, disse que Portugal “tem de pagar” custos da escravatura e dos massacres coloniais. Estas declarações foram prestadas a jornalistas internacionais. O cinquentenário desta data está a ser notícia também lá fora e o capitão Vasco Lourenço referiu, em tom de brincadeira mas que ao mesmo tempo demonstra a importância desta data, que se tem multiplicado em entrevistas para meios de comunicação internacionais.

Num monumento que existe em Belém aos caídos nas guerras (aqui entram muitas mais do que apenas a do Ultramar) são contabilizados cerca de 30 mil homens em 13 anos de conflito. No último Foro de La Toja falou-se que todas as famílias portuguesas sofreram de alguma forma com a guerra, incluindo aqueles que nasceram muito depois do dia 25 de Abril de 1974. Metade da população portuguesa já nasceu depois desta data ou quando a mesma aconteceu era muito pequena e como tal não se lembram de quase nada. Apenas que nessa quinta-feira (como amanhã) não haverá escola.

Como é o meu caso, que sou da geração de 90 (mais precisamente de 92) mas tenho um pai que foi comando na Guiné-Bissau (que muitos apontam como o pior dos cenários de guerra) nos meses que antecederam o golpe. O golpe dos Capitães que poderia ter sido das Caldas  imaginam uma revolução sem os cravos vermelhos da dona Celeste (filha de uma família com raízes em Espanha)?

Para aqueles que como eu não viveram neste período ou queiram saber mais sobre o mesmo, existem várias visitas a fazer, como é o caso dos agora museus do Carmo ou do Aljube. Em relação a esta antiga prisão, onde entramos e vemos as fotos de vários presos políticos, como é o caso de Álvaro Cunhal ou Mário Soares, as principais reações são de surpresa pela forma como as pessoas eram tratadas. Dali, tal como os Pides diziam, os presos saiam apenas para a morgue ou para o hospital  psiquiátrico Júlio de Matos. As torturas eram inúmeras mas todos os que passaram por lá destacam a tortura do sono, que consistia em não poderem adormecer e ficarem numa posição semelhante a de Jesus na cruz.

Isto era o que acontecia nos últimos dias do Estado Novo, mas para chegarmos aqui temos que olhar para os primeiros anos de uma ditadura que começou com os militares e acabou graças a eles (tal como aconteceu na «Casa de Papel», o MFA deu nomes de código de paises ou cidades a pontos-chave: RTP-Monaco). Este era o Portugal dos anos 70 mas como era a nossa pátria lá nos anos 30?

Um dos primeiros agentes que a Pide teve foi um guarda – redes da seleção portuguesa e do Casa Pia que fez furor nos Jogos Olímpicos de Amesterdão. O antigo atleta chegou a perseguir inúmeros membros da resistência que acabaram por fugir para a Galiza, incluindo um antigo PR português. Com a chegada de Franco ao poder, a fronteira com a Galiza foi reforçada. Mais a sul no mapa, a 25 de Abril de 1974, os helicópteros chegaram pela primeira vez a Barrancos para encerrar a fronteira para que nenhum Pide saísse por ali e para de uma forma bastante Hollywoodesca libertar um camião de presos políticos que iam para Beja. O golpe que aconteceu em Lisboa começou a ser recebido com rezas de preocupação e louvado com muita alegria e ansiedade por conhecer uma palavra até antes desconhecida: Liberdade!

Espanha teve um papel importante também na Revolução dos Cravos e ainda antes da mesma. O PCP contou com financiamento vindo de Espanha, no período em que era um partido da clandestinidade, e uma das suas grandes figuras antes de Cunhal, o Pavel, acabou por fugir para o México e viveu aí os seus últimos dias como jornalista especialista em arte. Voltou a Portugal já nos anos 90 mas a sua figura nunca foi totalmente restaurada pelo partido que foi um dos obreiros da revolução.

Falando sobre arte e a forma como esta é um espelho da atualidade, o artista plástico Bordalo II (conhecido pelas suas instalações) transformou a campa de Salazar numa caixa de comprimidos. A democracia deve ser tomada todos os dias e pela qual se deve continuar a lutar, como referiu José Pedro Aguiar -Branco no seu primeiro discurso como presidente da AR. Aguiar-Branco vai ser um dos participantes do desfile popular que vai descer a Avenida da Liberdade na tarde do dia 25 de Abril.

Voltando a atualidade, a comemoração do cinquentenário vai começar com a reprodução deste movimento que começou em Santarém e «desaguou» em Lisboa. Esperemos que o «Grândola» volte a dar sinal para a busca pela liberdade e vemo-nos daqui a cem anos. Veremos que mundo teremos nessa altura. A verdade, e tal como Pessoa já o dizia, ainda «faltasse cumprir Portugal» mas o 25 de Abril, esse será para sempre!

 

Andreia Rodrigues

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