“Feio não é bonito”: O show de horrores em Pindorama

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No espaço de uma semana, tivemos a oportunidade de ver claramente, diante de nossos olhos e dos olhos do mundo inteiro, os dois Brasis que vieram se configurando nos últimos anos. No dia primeiro de janeiro de 2023, na posse de Lula, um Brasil bonito, em festa, pacífico, sorridente e inclusivo. Sete dias depois, na balbúrdia bolsonarista, o Brasil feio, carrancudo, violento, ressentido e segregador.

O Brasil bonito é o Brasil do qual nos orgulhamos. O Brasil que remonta à bossa-nova, ao Cinema Novo, à Poesia Concreta, ao Teatro de Arena, à arquitetura de Niemeyer, à Tropicália, à Teologia da Libertação e à Pedagogia do Oprimido – movimentos estes ceifados em grande medida pelos militares de 64. Esse era o Brasil questionador e com gana de justiça, mudança e progresso social. Era o Brasil do “Feio não é bonito”, nome da canção de Carlos Lyra e Gianfrancesco Guarnieri que ficou conhecida pela voz de Nara Leão justamente em 1964, ano do golpe de estado. Essa música reivindicava soluções para os morros cariocas, rejeitando a visão idealizada da pobreza e da marginalidade social.

Já o Brasil feio é este que foi exposto a toda a comunidade internacional no dia 8 de janeiro. Um Brasil do qual nos envergonhamos. Um país que desmonta os serviços públicos de educação e saúde, que a duras penas vinham se fortalecendo em anos anteriores. Um país que, por pura ignorância, rechaça qualquer tipo de manifestação artística com tons de vanguarda e qualquer ato que dê visibilidade às consideradas minorias. Um Brasil negacionista, à contramão das pautas mais importantes discutidas hoje em dia no mundo, da ecologia ao feminismo, do racismo aos movimentos migratórios. Isso não é bonito.

O Brasil feio esteve no poder durante quatro anos. Acho que já poderiam se dar por satisfeitos. O país tem que voltar ao seu trilho natural, o trilho do Brasil bonito. Temos que voltar a nos mostrar ao mundo como aquilo que somos, um país criativo, inovador, vanguardista, líder regional sul-americano e uma das nações mais proeminentes no cenário ibero-americano e mundial. Os trogloditas podem até se contentar com a idealização de que o feio é bonito. Só que não. Sabemos que o feio nunca será bonito. O show de horrores que vimos no dia 8 de janeiro de 2023 em Brasília é o retrato de tudo aquilo que não queremos para o nosso país.

Pindorama estilhaçada

Pindorama era o nome que os indígenas davam às suas terras antes da chegada dos portugueses. Depois, nos transformamos em Terra Brasilis. Mas sempre seremos Pindorama. Não adianta negar as nossas origens. Outra coisa que não adianta negar é o caráter manipulável dos ignorantes. Bolsonaro sabia. Lula sabia. Os responsáveis pela segurança de Brasília sabiam. E até a minha avó já sabia que no dia 8 de janeiro haveria no Distrito Federal uma turba de vândalos ensandecidos atentando contra a Constituição, contra as Instituições, contra qualquer bom-senso e contra a Democracia – confesso meu receio em usar a palavra “democracia”, que vem se esvaziando de significado devido ao seu uso tão estendido (hoje em dia, tanto partidos de esquerda quanto de ultra-direita se escudam no termo “democracia” para justificar os mais descabelados pronunciamentos).

Mas vejamos: Lula sabia o que estava prestes a acontecer em Brasília. Por que não intercedeu? Na verdade – e essa é uma opinião pessoal –, toda a arruaça promovida na Capital Federal se voltará a favor do atual presidente. Se os bolsonaristas já eram o grande ridículo internacional antes dos atentados, sua pateticidade agora se torna inquestionável. O vandalismo em Brasília cai como uma luva para que Lula comece seu governo com amplo – amplíssimo – apoio internacional.

No âmbito espanhol, não foi novidade o apoio manifestado à Lula pelos partidos Podemos, PSOE e pelo presidente do governo Pedro Sánchez. O que sim pode ser considerada uma surpresa é o apoio do PP, tradicional partido de direita na Espanha, que condenou sem ressalvas os atentados do dia 8. E mais surpreendente ainda é o tom neutro do jornal ABC ao noticiar os ocorridos na capital brasileira. Para quem não sabe, o ABC é, entre os principais periódicos espanhóis, o que está mais à direita no espectro político. Cansei-me de ler nos últimos anos textos favoráveis a Bolsonaro nesse jornal. Agora, parece que abandonam o seu queridinho. Não é pra menos. Não interessa a ninguém habitar a mesma barca furada onde se encontra navegando a mais rança escória fascista latino-americana.

Enfim, os bolsonaristas, manipulados durante quatro anos pelo próprio Bolsonaro, agora acabam de ser manipulados também por Lula. A manipulação é o preço que se paga pela preguiça de se estudar um pouco mais a fundo a história nacional. As imagens nefastas das depredações já correram o mundo e acabarão de enterrar definitivamente a reputação de Jair e seus seguidores. Assim esperamos, para o bem do Brasil e para que reine a paz nestas belas e idílicas terras de Pindorama.

Sérgio Massucci Calderaro

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