‘Portunhol’, serie que apresenta histórias que dissolvem fronteiras

É em 'Portunhol' que nos entendemos em território ibérico, local onde as fronteiras geográficas não separam povos

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A serie Portunhol, da autoria da realizadora Ana Delgado Martins, vai estrear na RTP1 no dia 23 de Outubro, a partir das 22:30. Em episódios duplos, a produção da Real Ficção vai apresentar histórias comuns que dissolvem fronteiras. Esta serie teve a sua antestreia no Periferias Festival Internacional de Cinema. O que nos separa do outro?

Estamos a falar «de uma riqueza cultural incalculável e pouco conhecida, quase uma terceira cultura, que varia muito de Norte a Sul do país», como sublinha Ana Delgado Martins. Foi desta “mescla” que nasceu o o mirandês ou o quadrazenho. «O meu avô vivia numa aldeia transmontana bem perto da fronteira e, curiosamente, a terra espanhola mais próxima era Alcanizes, onde foi assinado o Tratado paz entre os reinos de Portugal e de Castela em 1297 que definiu os limites do território continental português. Fascinava-me toda a mística de atravessar uma linha invisível e de repente falar-se outra língua, comer «costoletóns» gigantes e comprar presuntos, chouriços e caramelos. Quando era criança, ainda se mostrava o bilhete de identidade para atravessar a fronteira. Antes de eu lá passar, tinha sido a época das fugas de Portugal a salto para escapar à miséria ou ao antigo regime, a época do «contrabando da barriga», a época das guerras, dos refugiados, e tanta riqueza junta pareceu-me merecer uma série documental», explica a responsável por esta serie documental.

São duas culturas que se juntam para lá das fronteiras existentes. Os dois países ibéricos entendem-se cada vez mais. «É sempre caricato ouvir portugueses a falarem espanhol – é o chamado Portunhol. Já os espanhóis nem tentam falar português porque dizem que nós percebemos tudo!». Foi desta forma que surgiu o titulo desta serie documental

Em Portunhol encontramos as aldeias irmãs de ambos os lados da fronteira.

«Descobrimos que há uma espécie de subcultura na zona da raia, onde todos se entendem em portunhol. Descobrimos que há pessoas que já nem notam que atravessam a fronteira por fazerem-no com tanta frequência, ou que muitos vivem do lado de lá da fronteira por motivos profissionais. Descobrimos que a raia é muito diferente de norte a sul do país – na zona de Elvas, por exemplo, a chamada «fronteira de sangue», decorreram algumas das batalhas mais sangrentas entre os dois países, enquanto que noutras zonas da raia, em particular na Galiza/Minho, a ligação é mais umbilical», disse a realizadora. Uma das coisas que acha que devemos importar do outro lado da fronteira é o hábito da siesta.

Vai-se descobrir um pouco mais sobre estas terras irmãs que se estendem ao longo da Raia, a fronteira mais antiga e estável de toda a Europa. «Quem vive na raia conhece muito mais sobre os costumes do país vizinho e adopta muitos dos seus hábitos. E isto acontece em ambos os lados da fronteira. Basta ver quando não havia televisão por cabo: os portugueses viam os canais espanhóis como se fossem os seus», lembra Martins.

«Geralmente, sendo zonas tão isoladas e muitas vezes despovoadas, por estarem no interior profundo longe dos centros de decisão, há muitas aldeias e vilas a colaborarem na organização de eventos e no uso de equipamentos municipais, unindo o melhor dos dois lados da fronteira. É sobretudo importante perceber como conseguimos transformar a raia numa fronteira pacífica após tantos anos de conflitos. O que poderemos replicar desta fronteira para o resto do mundo? Aquilo que percebemos é que quando a guerra era interna, dentro do próprio país, os vizinhos entreajudavam-se. Ainda há relatos de refugiados espanhóis escondidos em aldeias portuguesas no tempo de Franco, por exemplo. Mas não nos iludamos: quando chega a hora do futebol, continua a haver rivalidade».

Vizinhos que se entreajudam mas não esquecem as rivalidades desportivas

Portugal e Espanha estão em paz desde a Guerra da Restauração. Desde que D. João VI conseguiu recuperar a coroa que nenhum monarca português mais a usou já que a Virgem Maria, com a coroa aos seus pés (como foi possível ver no casamento real), é a verdadeira rainha deste «rectangulo a beira-mar plantado».  Tal como diria Saramago, uma «balsa de pedra» que nos torna irmãos inseparáveis para lá das nossas diferenças.

Uma fronteira que já assistiu a guerras, tratados de paz, casamentos, contrabando (como foi o caso do café de Rui Nabeiro) e muita festa. «Nas aldeias mais próximas, é habitual os vizinhos irem às festas de ambos os lados da fronteira. Hoje em dia há também muitas caminhadas organizadas pelas Rotas do Contrabando, por exemplo, além de ser comum os espanhóis procurarem-nos pela gastronomia e nós atravessarmos a fronteira pela gasolina mais barata», conta.

Esta serie passa por Chaves-Verin ou Vilar Formoso e Quadrazais. «Adorava fazer uma nova temporada de «Portunhol», porque a raia ainda tem muita história por contar», disse a realizadora sobre o que podemos esperar para o futuro. Portunhol poderá ser visto naa RTP1, todas as segundas-feiras, até ao dia 13 de Novembro.

Link para o trailler: Trailer – Portunhol on Vimeo

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