O TRAPÉZIO entrevista a António Reinas, o radialista que dinamiza a Radio Fronteira em Vilar Formoso (106.9 FM)

"Acredito num jornalismo ibérico com os dois idiomas, porque ele é uma peça chave para os cidadãos conheceram melhor as identidades de cada país"

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-Quando nasce a Rádio Fronteira e qual seria sua singularidade?

A Rádio Fronteira está no ar há 18 anos e emite nos 106.9 FM, a partir de Vilar Formoso, no concelho de Almeida, no distrito da Guarda, com uma cobertura que abrange os concelhos vizinhos do Sabugal, Figueira de Castelo Rodrigo, Pinhel e Guarda, entrando também em Espanha, na comarca de Ciudad Rodrigo.

A Rádio Fronteira nasceu no dia 2 de Março de 2002, com o objetivo de promover e aproximar os povos da Raia. A nível musical, a Rádio Fronteira privilegia a música portuguesa e a música espanhola. A sua singularidade é absorver as duas culturas, a portuguesa e a espanhola e os dois idiomas.

-Como é o espaço informativo semanal “Espaço Intercâmbio” em colaboração com a rádio espanhola de Ciudad Rodrigo, Onda Cero?

O “Espaço Intercâmbio”, que se encontra suspenso, mas que deverá ser retomado em breve, é um espaço informativo semanal, de cerca de 10 minutos, em colaboração com a Rádio de Ciudad Rodrigo, Onda Cero, de divulgação da atualidade de ambos lados da fronteira.

A Onda Cero, envia para a Rádio Fronteira, em espanhol as notícias, fazendo um “recorrido” da atualidade da semana na comarca de Ciudad Rodrigo e a Rádio Fronteira de Vilar Formoso, faz para a Onda Cero, um balanço da atualidade da semana nos concelhos raianos, em língua espanhola, já que os espanhóis têm mais dificuldade em perceber a língua portuguesa. A 20 km da fronteira, como é o caso de Ciudad Rodrigo, por exemplo, não é tão evidente entender o português. Mais nos afastamos da fronteira, do lado espanhol e também do lado português e mais difícil é para as pessoas, entenderem as duas línguas.

-A fronteira de Vilar Formoso-Fuentes de Oñoro parece especial pelo transito do trem nocturno Lusitania Express e o transito de camiões caminho da Espanha e além os Pirineus. Entre Guarda e Salamanca. Como caracterizaria a identidade cultural e os intercâmbios transfronteiriços desta região?

A identidade da região do lado de Portugal, está muito influenciada pela cultura espanhola que entra em território português: a televisão tem por exemplo um peso considerável, mas também a vida social festiva, as verbenas populares e a tradição taurina, que é replicada de uma certa maneira, do lado português com especial incidência, nos concelhos de Almeida e Sabugal. A influência cultural é tão importante que infuencia também os modos de vida e de pensamento, com espiríto mais aberto, mais recetivo e pronto a absorver o que vem de Espanha. No entanto, o contrário não é tão evidente, já que o espanhol, não absorve tanto a cultura portuguesa.

Os intercambios transfronteiriços existem desde sempre e têm vindo a crescer, seja a nível económico, social e cultural. Por exemplo em Fuentes de Oñoro vivem e trabalham muitos portugueses. Há também muitos casamentos em comum.

-Como podemos ouvir a rádio pela internet ou pelo menos “Espaço de Intercâmbio”?

A Rádio Fronteira, disponibiliza regularmente notícias, reportagens, entrevistas e programas em formato Podcast, para ouvir a qualquer hora. Nesta altura não é possível, por motivos técnicos, ouvir a emissão da Rádio Fronteira, pela Internet.

-Como vem afetando a crise económica por culpa do encerramento de fronteiras?

Como ambos lados da fronteira são dependentes uns de outros, no caso de Vilar Formoso e Fuentes de Oñoro, as dependências são recíprocas, formam na verdade um só território, já “sem fronteira”.

Com as fronteiras encerradas, em Vilar Formoso, a vida está complicada para o comércio e a restauração, por exemplo, os restaurantes e lojas, não têm a sua clientela habitual espanhola e em Fuentes de Oñoro, os supermercados, os talhos e bombas de gasolina desesperam pelos seus principais clientes, os portugueses.

Esta semana houve um encontro entre eurocidades ibéricas, onde também participaram Vilar Formoso e Fuentes de Oñoro (e Almeida) como projeto de eurocidade. Eles pediram o fim da fronteira, especialmente na questão da liberdade de movimento para cidadãos raianos. Entre Vilar Formoso e Fuentes de Oñoro há ruas cortadas, a própria sede da rádio fica justo no limite, este encerramento foi cumprido ou existe um ressurgimento do “contrabando” no sentido de haver movimento clandestino de pessoas? Quais são as principais demandas da sociedade raiana?

Portugueses e Espanhóis pedem nesta altura entre as duas localidades que seja dada a possibilidade de passagem, porque esta situação da fronteira controlada e encerrada há 2 meses e vai para o terceiro mês, até dia 15 de Junho, vem prejudicar gravemente a economia local.

No principal ponto de fronteira, apenas é autorizada a passagem aos trabalhadores transfronteiriços, já no outro ponto de fronteira, na fronteira velha, trata-se de um ponto não autorizado de passagem, onde foram colocadas barreiras fisicas para impedir a circulação automóvel, mas as pessoas continuam a passar a pé todos os dias para irem fazer as suas compras aos dois supermercados ali próximos, o Supermercado Emilio e o Supermercado Raimundo.

Após 2 meses sem relacionamento, uma grande maioria de pessoas tanto do lado português como do lado espanhol, gostava de poder passar livremente a fronteira, seja por questões económicas, de lazer ou até familiar. Apesar de alguns receios de contagios de Covid-19, de ambos lados, pede-se a reabertura da fronteira, nesta altura.

-Acredita que pode existir um jornalismo ibérico, em ambas línguas, que puder ultrapassar as fronteiras das agendas mediáticas nacionais que prestam menos atenção a um relacionamento mais estratégico e perto entre Espanha e Portugal, e a Raia como exemplo de um iberismo pragmático e respeitoso? Após de duas décadas, que balanço faz da sua atividade de “furar” a fronteira mediática?

Sim acredito num jornalismo ibérico com os dois idiomas, porque ele é uma peça chave para os cidadãos conheceram melhor as identidades de cada país, até porque existe ainda um grande desconhecimento entre as pessoas, sobre os territórios, por exemplo a nível turístico. A Raia é um exemplo de bom relacionamento entre povos, de fusão e simbiose de culturas.

Através das ondas da Rádio Fronteira, é possível galgar esta “fronteira”, que já não existe nas nossas mentes. Somos uma fronteira “sem limite”, somos ouvidos tanto em Portugal como em Espanha e fazemos emissão para dois povos, duas culturas, que são na verdade, uma só identidade, a Raiana, longe dos centralismos de Lisboa e Madrid, de forma natural, livre e multifacetada. Sim porque o nosso lema é “A Fronteira Que Nos Une”!

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