Olivença, cinco séculos de passado português e uma fala única

Este enclave fronteiriço celebrou o Dia Mundial da Língua Portuguesa

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Ao chegar à pacata localidade de Olivença, na região espanhola da Extremadura, com cerca de 12.000 habitantes, a herança de cinco séculos de passado português percebe-se a cada passo na sua arquitetura e no típico empedrado das suas ruas, mas se o atrativo é o seu património, o que a torna realmente única é a sua fala. Não é apenas diferente pelo chamado português oliventino, um subdialeto do Alentejo oriental “poluído” pela língua espanhola, como também porque “quando se fala castelhano em Olivença o português está aí”, como se demonstra no mau uso de alguns tempos verbais, explica à Efe o especialista Eduardo Naharro-Macías.

A fala oliventina, reconhecida pela Carta Europeia das Línguas Minoritárias, tem também palavras próprias sem referência no castelhano e português. Este enclave fronteiriço celebrou esta quarta-feira o Dia Mundial da Língua Portuguesa com uma jornada cultural que pretende promover a declaração do português oliventino como Bem de Interesse Cultural. De forma paralela, os estabelecimentos comerciais têm nestes dias cartazes de uma campanha de promoção da sua língua, com palavras como “¡ay madre!, ¡ay mai!, minha mãe!”, em espanhol, oliventino e português, respetivamente.

Para entender tão importante legado há que conhecer a história de Olivença, cuja origem está ligada à reconquista de Badajoz pelo rei Afonso IX de Leão em 1230. Depois, em 1297, Fernando IV de Castela cedeu-a ao rei Dom Dinis de Portugal (Tratado de Alcanizes) e, depois de mais de 500 anos de dependência portuguesa, passou à coroa espanhola com o fim da Guerra das Laranjas (1801).

Essa mistura é vista em todos os aspetos e é o que torna Olivença “única”, segundo Joaquín Fuentes, membro da Comissão Educativa para o Português. Fuentes destaca à Efe que Olivença tem os melhores exemplos de arte manuelina fora de Portugal, como a Igreja de Maria Madalena, e o seu legado está também presente em doces como a técula mécula e na música.

Ao visitar Olivença, os portugueses sentem-se “muito identificados” com o seu passado, enquanto os espanhóis vêm que é um lugar “muito diferente”, aponta. Na sua opinião, o oliventino está orgulhoso do seu passado. Agora já tem a opção de optar oficialmente à dupla nacionalidade, um passo já dado por um milhar de pessoas. Para alguns isto será simplesmente algo “afetivo”, mas aos mais jovens pode abrir portas académicas e ao mundo laboral, de acordo com Fuentes. Ao falar de português nesta localidade não se pode esquecer das escolas, tal como a secção bilingue infantil do colégio Francisco Ortiz, a primeira de Espanha e a única da Extremadura.

Destaque ainda para a aula municipal de português dada por Naharro-Macías, que comenta, entre outras iniciativas de difusão, a nomenclatura dupla das ruas no centro histórico. Naharro-Macías indicou que o português oliventino persiste entre os maiores de 65 e 70 anos, que o falam entre si na rua e em casa, e reconheceu que “corre perigo”.

Durante um tempo este esteve “estigmatizado” como uma língua pobre e de baixo nível, e critica que seja descrita como “portunhol”. Um exemplo muito puro desta língua é oferecido por Sebastiana Martínez, uma viúva de 93 anos, de San Benito de la Contienda, que comenta à Efe que a forma de falar nesta aldeia é diferente à da vila de Olivença.

Sebastiana conta que o português oliventino foi a primeira língua que aprendeu e que, embora tenha crescido na pobreza, os seus irmãos e ela sempre foram à escola. Segundo ela, esta língua é ainda falada por muita gente na aldeia e ressalta que o fala com a sua filha mais velha. E despede-se na sua língua com uma canção que em português se traduz assim: “Dizem que lá em Lisboa a vida é boa. Andam aos pulos. Vão às raparigas com a saia curta e a mostrar as pernas”.

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